Sempre achei que São Paulo não passa de uma grande cidadezinha do interior. Amo esta cidade com todas as minhas forças e com todos os problemas dela, e acho que esse fato não a desmerece nem um pouco, mas cada dia tenho mais a certeza de estar vivendo num lugar onde todo mundo se conhece e onde todo mundo, querendo ou não, pode estar por dentro da vida dos outros.
Só sei que vivendo nessa aldeia, temos que tomar muito cuidado com tudo que fazemos, pois nunca se sabe onde vai se cruzar com o próximo amigo-do-amigo que por um infortúnio lembra de você, ou com aquela menina que você saiu um tempo, ou mesmo com a mãe carola daquele seu amigo de presepadas.
Sempre achei que essas coisas só aconteciam comigo, depois conversando com os outros, trocando esse tipo de história, parei com a mania de perseguição e ví que era com todo mundo que acontecia, mas ao conhecer o Sérgio eu tive a certeza que comigo acontece muito pouco.
O Sérgio é um cara bacana, sensível, tem um bom emprego, um bom apartamento, um bom papo, cozinha bem, discursa bem e já passou por esse tipo de histórias tantas vezes que nem lembra qual delas foi a pior, mas com certeza a última vai ficar na cabeça dele por um bom tempo.
Digamos que por estar passando por um período meio foda no trabalho o Sérgio não saia com ninguém fazia tempo. Depois que a pressão aliviou um pouco, numa balada meio aniversário de um amigo nosso, o Sérgio conheceu a Karine e começaram a sair. O Sérgio não achava a Karine tudo isso, mas ela era linda, o fazia rir, era arquiteta, morava com uma amiga perto da casa dele, transava legal, as coisas foram se levando uma a outra e quando ele se deu conta já estava saindo com ela há umas duas semanas. As saídas dos dois nunca eram muito profundas, ele nunca tinha ido na casa dela, nunca tinha a levado em festas. No fundo o Sérgio não sentia firmeza na Karine, a achava meio sem sal, não rolava muita química, mas como o lance tava indo bem ele não reclamava e esparava a fila andar.
Dia desses, num esquentinha de outros amigos onde a bebida tava rolando solta, o Sérgio esbarrou com a Márcia e foi amor a primeira vista. Se atracaram na festa com requíntes de um vexame duplo e pra não piorar as coisas decidiram ir pra casa da garota, o Sérgio tava meio com medo da Karine ligar e coisa e tal, então preferiu um território neutro.
A noite do cara foi incrível, a Márcia se mostrou ser tudo que o Sérgio esperava, ela era tudo que a Karine era, mas nela ele sentiu a química que faltava na Karine. Na manhã seguinte, acordadando de cuecas o Sérgio saiu pelo apartamento em busca da mulher da sua vida. Qual não foi a surpresa do moço ao encontrar a Márcia e a Karine sentadas na copa do apartamento?
As amigas que moravam juntas, enganadas pelo mesmo calhorda, tudo se juntou na cabeça dele. Como ele podia ter saído com as duas, que conheceu em lugares completamente diferentes, em festas de amigos completamente opostos, e ter transado com as duas em menos de duas semanas? O que ele ia falar agora? Na minha opinião, o Sérgio tomou a única atitude que um macho de respeito poderia tomar numa hora dessas: passou a mão nas calças e foi embora, sem dizer uma palavra. Ele nunca mais as viu, e nem ligou pra nenhuma das duas.
É, tem situações que nem morando numa grande metrópole, a gente consegue escapar. Vai explicar uma história dessas! Só vivendo numa cidadezinha dessas bem pequenas, como São Paulo por exemplo, pra poder entender...