Thursday, June 21, 2007

HOME ALONE

E então um dia você o acha! E ele está lá, lindo, branco, conservado, todo estiloso e com um piso de madeira, daquele de taquinho dos anos 60 de fazer inveja a muita mansão da vizinhança. Você de primeira não acredita, pensa que é mentira que finalmente alguma coisa que você gosta, cabe no seu orçamento. Mas é verdade e como num passe de mágica, tudo que conspirava contra até então, vai por um caminho sem buracos que culmina na entrega das chaves do seu apartamento perfeito.
A cerimônia de entrega das chaves da sua nova casa começa com você sozinho comendo uns polvilhos no chão sujo da sala, e termina com alguns amigos e familiares tomando coca light no mesmo chão sujo. A primeira faxina é nojenta, o primeiro banho é medonho, a primeira noite estranha, mas é tudo lindo, tudo poético, tudo solucionável.
Até que chega a hora de mudar de verdade e o seu primeiro final de semana se resume à uma arrumação que parece nunca mais ter fim. E não tem mesmo. Nessa hora, tudo que era lindo, poético e solucionável, vira pó. Literalmente.
Além disso, a quantidade de transeuntes dentro do seu lar é algo inimaginável. Tem o cara do fogão, os entregadores da geladeira, o pessoal que veio montar a cama, o homem do vidro, o maluco das chaves, o porteiro te explicando a política do prédio, a síndica, os vizinhos da frente com um bolo, a mãe empolgada, os amigos que passam pra "conhecer", o sobrinho, os irmãos, o cunhado e o pai instalando algumas coisas, entre outras milhares de pessoas.
É tanta gente, tanto barulho, tanta confusão e sujeira, que quando todo mundo vai embora, e você fica sozinho em casa o melhor que se tem a fazer é acender um cigarro, pegar uma latinha de qualquer coisa bem gelada, um resto de pão com alguma gororoba e sentar na frente da máquina de lavar pra assistir um ciclo completo. E essa com certeza será uma das melhores lembranças do dia que você foi morar sozinho. Você tomando a sua cerveja, fumando seu cigarro, comendo seu pão com gororoba e assistindo a sua máquina de lavar trabalhar na sua casa.

Tuesday, June 12, 2007

A CASA DOS GATOS

Faz um tempo já. Na verdade parece que faz mais tempo ainda. Sabe aquilo que faz tempo, mas que por ser outra fase, parece que faz mais tempo do que realmente faz? Pois é... Essa história é dessas histórias. Era por coincidência dia dos namorados também, como hoje. E quatro amigos revoltados com a data foram comemorar o fato de serem solteiros, de passarem o mundo na cara e de se divertirem com desaventuras.
Nessa noite, na noite de rir de sí próprio, foi que esses amigos criaram um lugar muito especial. Nessas de "pra onde a gente vai?", "o que vamos fazer agora que estamos bêbados?", uma das meninas sugeriu a Casa dos Gatos. No cenário meio non sense que aquela noite estava virando, não foi estranho o fato daquela amiga começar a se abrir.
Ela disse que apesar da companhia se sentia só, que apesar das risadas se sentia triste e que apesar da bebida sentia medo. Um medo diferente, um medo de futuro que se aproximava do presente, um medo que a levasse à um fim na Casa dos Gatos.
A Casa dos Gatos dos pesadelos dessa amiga era um lugar escuro, onde provavelmente povoada por clichês da infância, a garota colocou a velha solteirona, de 73 anos, que cansada de ser sozinha, criava gatos pra amenizar a solidão. Não 1 nem 2 gatos não, coisa de 23, 47 bichanos loucos de fome e miando sem parar. E a velha conhecia cada um, pelo nome, cada mania, cada cicatriz e cada desafeto dos bichinhos.
Nem preciso dizer a cara dos outros 3 na mesa, passada a descrição do pesadelo de velhice infame que assolava a quarta integrante do grupo. Se fez silêncio por um tempo até que um dos 3 soltou um: "Relaxa, a gente vai te fazer companhia lá". E então, à partir desse momento, a Casa dos Gatos se tornou menos pesada, menos fúnebre e ganhou uma TV de plasma, uma mesa de carteado, uma infinidade de cd's, muitos passaportes carimbados e muita, mas muita mesmo bebida em estoque.
Desse dia em diante, todos os happys, todos os dias, esses amigos celebravam a idéia de que a Casa dos Gatos era um porto seguro, um lugar pra onde correr quando tudo desse errado, um lugar não tão ruim assim porque a gente tinha a gente.
Mas a vida separou a gente, a amiga assombrada hoje está cada dia mais longe da Casa dos Gatos, e numa saída recente com as duas com as quais ainda tenho contato dia desses uma delas soltou: "a gente se bastava né?". E era isso mesmo, a Casa dos Gatos perdeu seu poder de assustar porque a gente se bastava.
Óbvio que ainda hoje, às vezes eu ainda tenho medo da Casa dos Gatos, como nesse dia dos namorados sozinho, até porque na minha casa não teriam gatos, que são animais aos quais sou alérgico. Mas então, de lá de dentro vem um pensamento: "Será que eu me basto?", e aí vem a resposta: "Acho que sim..." e tudo fica mais tranquilo.