Monday, August 29, 2005

RELACIONAMENTOS MODERNOS

Ele gosta de vinho, ela de cerveja. Ela sai com as amigas, ele vê futebol em casa. Ele gosta de Metallica e ele não está nem aí. Ele sonha em ter filhos e ela é só pra carreira. Ela compra rimel e ela se veste mal. Ele quer alçar novos vôos e ela morar perto da mãe. Ela só anda de moto e ele comprou um Scenic. Ele só canta samba e ela faz chapinha na sexta. Ele não contou pros pais e mãe dele dá o maior apoio. Ele tem duas mulheres e ela não vive sem ele. Ela é safada e falante e ela quieta e na dela. Ele é metrosexual e ela não frita um ovo. Ele trabalha o dia todo e ela faz compras à noite. Ela almoça no Mc e ele no Figueira. Ele gosta de dirigir, ela gosta de falar. Ele quer morar junto e ele ser promovido. Ele malha sozinho, ela joga volei no clube. Ela quer viajar de navio, ele dormir no domingo. Ele comprou um apê, ela não sai do especial. Ele sonha acordado e ele é "maior pé-no-chão". Ela não menstrua mais e ela ainda sofre de cólica. Ela detesta a irmã dele, ele já beijou a irmã dela. Ela viaja sozinha e ele pra casa dos pais. Ela fez de um tudo e ela mal sabia beijar.
Os pais dele sempre gostaram dela, os dela nunca gostaram dele. Ele quer o azul, ela também mas não fala. Ela o acha careta, ele também mas não aceita. Ela o ofende, ele a abraça, ela dá tapa, ele dá grito. Eles são loucos, mas se compreendem.
Eles nunca se encontram, elas brigam demais. Eles são gays assumidos e eles conservadores proscritos. Eles não se falam mais, eles ficaram amigos depois. Eles são "prafrentex" e eles nem tem tempo pra isso. Eles fazem swing e elas nem sabem que existe. Os dois fazem tudo juntos, mas tem banheiros separados. Os dois não combinam em nada, mas dormem juntos todo dia.
Eles e elas, eles e eles, elas e elas, são tantas as combinações, tantas as histórias, tantas as diferenças, tantas as desigualdades e as semelhanças. O bonito de hoje é que tem pra todo mundo. A oferta tá muita, a procura tá baixa mas a gente vai tentando, vai levando... Deve ser aí que está a graça.

Sunday, August 28, 2005

QUANDO AGOSTO PASSAR

Não sei quem inventou que agosto era um mês difícil, azarento e não sei mais o que, mas essa pessoa estava com total razão. Em agosto já cairam de presidentes a grandes cantoras e fuçando um pouco, dá pra saber que não é só por aqui que existe essa supersitição.
Os romanos deram ao oitavo mês do ano, o nome de agosto, em homenagem ao Imperador Augusto, quando ele estava em alta conquistando o Egito, mas não gostavam de agosto desde aquela época, e pelo visto, nem do Augusto. Eles acreditavam que durante todo o mês um dragão cuspidor de fogo passeava nos céus do hemisfério norte.
As mulheres portuguesas nunca viram tal dragão, mas na época das grandes navegações nunca se casavam em agosto. Se casar nesse mês significava ficar só, sem lua-de-mel e até mesmo viúva. Na Argentina em compensação, ninguém ligava se casava em fevereiro ou outubro, mas ninguém lavava a cabeça durante Agosto inteiro, pois isso significava chamar a morte para perto de sí. E no Brasil, quando a morte já estava perto, era em agosto que ela se manifestava, arrastando correntes e assombrando os vivos.
O engraçado é que conversando com pessoas próximas pude perceber que, ainda hoje, ninguém gosta de dar guinadas na vida em agosto, nem mudar de casa, nem de emprego, nem fazer grandes viagens, nem de casar e nem de fechar grandes negócios. Olha que nem são pessoas superticiosas, mas que no final da conversa sempre soltam aquela frasezinha típica de Vó interiorana: "Agosto não é bom pra essas coisas, você sabe né". Na boa, sei sim, mas não me pergunte o porque.
Só sei que foi em agosto que o Japão invadiu a Coréia, às custas de muito sangue, de muitas lágrimas; em 1º de agosto de 1914 começou a 1ª Grande Guerra Mundial; em 2 de agosto de 1932, Hitler assumiu o governo da Alemanha; em agosto de 1939 se iniciou a 2ª Guerra Mundial; em agosto de 1945 as cidades de Hiroshima e Nagazaki foram destruaidas pela bomba atômica matando mais de 200 mil pessoas; e também em 13 de agosto de 1961 foi iniciada a construcão do muro de Berlim. Mas não foi só mundialmente que o mês do cachorro louco, deixou marcas tristes, em 6 de agosto de 1957 as estatísticas acusaram um saldo de cem mil desempregados em São Paulo; em 13 de agosto do mesmo ano foi decretado estado de calamidade pública no país em conseqüência da epidemia da gripe asiática, transformando em hospitais de emergência as escolas, clubes, repartições estaduais e federais; foi em agosto também que Getúlio se matou, Quadros renunciou e Juscelino morreu.
Credo!! Depois de tanta coisa tétrica, depois tantas agruras da humanidade que aconteceram em agosto, não me admira que fique essa aura pesada voando. Mas o que fica é um sentimento de não ver a hora desse mês conturbado passar, e também a compreensão para com aqueles que não são supersticiosos mas acreditam nas "brujas" de agosto. Que venha setembro, com a primavera e com tudo mais em cima. Pensando bem, primavera tráz pólen, polén traz rinite... Ai, que saudades de janeiro!

Tuesday, August 23, 2005

FELICIDADE RAPARIGA

Marisa era moça direita, no melhor sentido que isso possa expressar. Morava com as tias em Lins, e não havia rapaz que não se enamorasse por ela. Dona de um corpo esguio, de seios fartos, pele curtida, um riso frouxo e um olhar safado, Marisa era virgem, donzela e ponderada com isso. Só queria se entregar casando, pra moço bom, de família, orfã desde a infância, Marisa queria filhos, muitos, uma mesa cheia deles. Não era raro ver diante da porta da casa de suas tias, moços interessados em cortejar Marisa, mas pra ela nada adiantava, sabia no fundo, que quando fosse a hora, olharia no olho do moço, bom e de família, e teria certeza que esse era o escolhido pra vida toda.
Com o passar do tempo a cidade se acostumou com Marisa, sua porta já não vivia tão cheia, seus pretendentes foram se casando com outras, mas seus sonhos, esses sim foram aumentando. Foi então que uma das tias de Marisa adoeceu, câncer coitada! Foi um tal de médico entrando e saindo daquela casa. Ninguém arrumava um jeito de amenizar ao sofrimento da infeliz.
Certo dia apareceu por lá, um doutor galego, cheio dos olhos azuis, de palavras escolhidas e de modos louváveis que além de acalmar a dor da tia, levou consigo o coração de Marisa. Ao cair das tardes de consulta, entre seringas e remédios, a moça era só sorrisos, enriquecia o cardápio dos lanches, lavava os cabelos com água do poço bom, se perfumava, e se arrumava para esperar a visita que não era só dela. Não demorou muito para o moço perceber suas intenções, e depois de uma passada rápida, de modo inesperado, atrapalhado e até um pouco boboca, ele a convidou pra um cinema, no domingo, à tarde.
E no domingo enfim a Marisa era só felicidade, mal conseguia conter as borboletas que tremiam na sua barriga. Sua ansiedade lhe fazia ouvir sinos e só a idéia de estar sozinha com o médico galego, dava-lhe um sentimento de bambear as pernas e um arrepio que vinha subindo nuca.
Na hora marcada, se encontraram os dois no cinema do centro, filme de amor, com beijo no fim, e com beijo no meio também, só que aí era um beijo de Marisa, no médico. Ela não podia acreditar no que estava acontecendo, tudo que sempre sonhou estava se tornando realidade bem na frente dos seus olhos, sentia por ele algo tão intenso que se, naquele momento, ele lhe fizesse qualquer proposta indecente ou inimaginável ela teria aceitado. Mas o moço não fez. Levou Marisa embora em segurança, de braço dado pela calçada, prometendo que iria visita-la quando fosse ver à tia, na terça, às 5 em ponto.
A noite lhe pregou peças suadas, de um desejo contido por anos, um calor lá de baixo que umedecia os seus sonhos e não lhe deixou dormir. De manhã, tomada de um sorriso besta, grande e estampado no meio da cara, Marisa foi servir o café pra tia doente, no quarto do fundo ao lado da sala, e qual não foi a surpresa, de ver a tia motivo do médico, mortinha na cama, com os olhos virados.
Marisa sorriu, como que rindo da mazela que o destino lhe pregara, um riso irônico, meio que sabendo que aquela felicidade toda não era pra ela. Não haveriam mais visitas ao cair da tarde, nem lanches demorados, nem cinema de domingo e principalmente, não haveria mais a visita da terça. Decidida deixou a bandeja sobre a cama, fechou a porta e saiu calada. Não derramou uma lágrima a pobre. Foi a outra tia que encontrou o corpo de Marisa na banheira, pulsos cortados, tadinha!
Na cidade ninguém soube nada porque se matou Marisa, muito menos o médico que tinha por ela um carinho. Uns acharam que foi pela tia, outros por um parafuso a menos, talvez, mas o que ninguém imaginava é que Marisa tinha morrido de véspera, pelo que achava que era sua sina.

Sunday, August 21, 2005

A VERSÃO E O FATO

Orelha de livro sempre foi uma coisa que me fascinou. Passar horas em uma livraria só escolhendo o que, um dia, você poderá vir a ler é algo que dá prazer sem precedentes. Numa dessas, semana passada eu achei um livro que falava sobre o Big Ben, o relógio mais famoso do mundo. O livro contava a história do imponente relógio que fica na Torre do Parlamento Britânico, a St. Stephen´s Tower, e revelava um fato que pouca gente sabia até então que Big Ben não é o nome do relógio, e sim do sino de 15 toneladas, cujas badaladas de 8 notas marcam com pontualidade britânica as boas e a as más horas do Reino Unido. Além disso, o sino levou esse nome por ter sido encomendado por um cara que tinha mais de 150 quilos e era o Diretor do Departamento de Obras Públicas da Iglaterra na época, Sir Benjamin Hall, o Big Ben.
Esse banho de cultura inútil, me fez pensar em duas máximas da minha vida, primeiro em como eu consigo gastar tanto, do meu precioso tempo que me é sempre tão curto, ocupando minha cabeça com bobagens desse tipo? E em segundo em como é difícil e às vezes impossível saber a verdade sobre alguma coisa.
Fiquei tão espantado com o meu nível de ignorância no assunto que fui para o grande oráculo e só numa busca rápida, eu achei mais de quatro versões oficiais para o nome do Big Ben (sim eu perdi mais tempo procurando). Na boa, pouco me importa se é o nome do relógio ou não, se essa é a verdadeira história do nome do sino ou não, mas como dizia José Maria Alkimin: "O importante não é o fato, e sim a versão". Começando a pesquisar sobre qualquer história, e eu estou falando que qualquer coisa mesmo, você vai perceber que o que prevalece é sempre a versão mais interessante, ou a mais glamurosa, ou a mais original, ou um monte delas, mas raramente será a verdade. Temos exemplos disso nas milhares de versões sobre o "Grito do Ipiranga", sobre quem matou a Odete Roitman quando Vale Tudo passou em Portugal, ou mesmo em histórias que servem para justificar de onde saiu o dinheiro do Marcos Valério.
Existem várias versões para todas as histórias do mundo, até mesmo para aquela que você viveu ontem, e isso é profundamente irritante se você for analisar. Pense que se sua história só tiver você e mais alguém de personagens, ela terá no mínimo 3 versões, a sua, a do alguém e a verdade. Isso porque tanto você quanto a outra pessoa, vão dar as versões baseadas em suas vivências, em seus parâmetros, e dos seus pontos de vista particulares. E quanto a verdade, nós que ouvirmos a história, jamais saberemos.
Disso tudo só resta dizer que a única verdade de que vamos sempre ter certeza é da nossa mesmo, às vezes nem essa, e temos que conviver com isso e levar a vida assim meio que às cegas deixando nos nortear pelo que sentimos e pelo que acreditamos. Mas na boa, essa é só a minha versão...

Thursday, August 18, 2005

CAPPUCCINO ASSOMBRADO

O seu dia foi normal, atribulado como sempre mas estressante o suficiente para te fazer aceitar qualquer convinte que recebesse para sair. Ao cair da tarde o telefone toca, o visor do celular mostra um nome que parece gritar pra você não atender. Ignorando qualquer aviso ou premunição você atende, do outro lado a voz conhecida e sombria te convida para um café, depois das 10, no lugar de sempre.
Conforme havia sido combinado, depois das 10 você entra no lugar marcado. O Fantasma já te espera, sentado na mesa, tilintando nos dedos um som que lembram os passos de um condenado. Ao sentar na sua frente, você o encara, sorri, mas ele não. O Fantasma está sério, com seu ar translúcido, reclama do seu atraso e te faz lembrar do tempo que te assombrava. Um garçom de preto e com olheiras fundas vem tirar os pedidos, pro Fantasma um Mooca e pra você um Cappuccino. O Fantasma começa a fezer perguntas, as de sempre, como você está, como anda o trabalho. Você se pergunta o que ele quer realmente, olhando através dele você se pega rezando.
A conversa do Fantasma te fascina, ele sabe como seduzir e tem larga experiência em atrair os humanos para o seu covil. Você se pega mais relaxado, rindo do que ele fala, respondendo suas perguntas sem tantas defesas. Como o Fantasma é bonito, sabe conversar, te faz se sentir bem, por que você estava com tanto medo de vir ao seu encontro?
O Fantasma levanta, diz que vai ao banheiro e sai arrastando correntes pelo café movimentado. Você o segue com os olhos e, ao olhar de longe, nota que ele volta a ser um fantasma assustador, a fazer parte do passado, e que a figura que a pouco te seduzia, deve continuar onde sempre esteve desde quando você a exorcisou. Longe dele as piadas que te faziam rir, agora te causam náuseas, as perguntas que você respondia facilmente te causavam calafrios.
Nervosamente você procura o garçom de preto, pede a conta e começa a ter fé que ela chegará antes do Fantasma voltar à aparecer. Você pede pressa, a conta não chega, qualquer segundo pode ser crucial. Sem aguentar a angústia da espera, você se levanta e paga no caixa, paga o seu e o do Fantasma, afinal são os 7 reais que vão te livrar dele pra sempre. Sua idéia é fugir antes do Fantasma retornar, é deixar o Fantasma sem sótão pra assombrar.
De repente você sente uma mão gelada tocar seu ombro. O Fantasma agora assustado te pergunta o que aconteceu. Com qualquer evasiva, você diz que tem que ir embora. O Fantasama resmunga qualquer coisa, começa a te convencer a se encontrar de novo com ele, você responde que sim, que qualquer dia desses, podem marcar qualquer coisa, diz pra qualquer coisa ligar e sai meio de qualquer jeito. O Fantasma ainda tem tempo de te alcançar e tentar te entregar uma nota de 10 reais, você recusa e diz que fica pela companhia.
Quando você entra no carro, pensa que ele vai demorar pra pegar como nos nos filmes de terror, só para dar mais uma chance ao Fantasma, mas isso não acontece. Você parte com o carro e percebe que o Fantasma está te olhando. Sem pensar muito você acelera, olha o Fantasma sumindo no espelhinho do carro, e toma consciência que lugar de assombração lá mesmo, no seu passado, como uma imagem no retrovisor.

Tuesday, August 16, 2005

O ESTILO MARIA EDUARDA

Maria Eduarda é linda, jovem, com o corpo todo no lugar, a altura boa, a roupa certa, sempre de grife, sempre discreta. Maria Eduarda também tem um nome de grife, quatrocentão, passeia feliz por festas fechadas, onde atende por Madú. Maria Eduarda também é inteligente, mais do que precisa e menos do que deveria ser, tem sempre uma opinião para cada assunto, personalidade forte. Maria Eduarada é bem relacionada, vai pra Angra com fulana, pra Punta com Ciclana e quando era pequena, era "assim" com os Diniz. Maria Eduarda conversa bem, estudou nas melhores escolas, fez as melhores viagens, frequantou as melhores rodas. Maria Eduarda ao primeiro encontro sempre se mostra completa, tudo que todo mundo sempre sonhara.
Maria Eduarda nas festas nunca está só, mesmo que para isso tenha que acorrentar um tadinho com falsas promessas, enquanto se usa dele para dar o bote em outros. Maria Eduarda faz coisas feias, mas diz que nunca fez, dissimula alterada, mente calada. Maria Eduarada coleciona inimigos, mas os comprimenta como numa grande festa, faz suspense sobre histórias, sustenta um ar de saber demais, se mostra confiável. Maria Eduarda conversa se colocando como comum, se faz modesta, sempre espera ser exaltada, ser elogiada, pois esse é o papel do homem para com uma moça de família. Maria Eduarada faz a linha carente sem noção de suas atribuições, estilo mais recomendado pela etiqueta tradicional para "mocinha casadoira". Maria Eduarda bebe, e bebe bem, e fica chata, como se já não fosse.
Maria Eduarda fez carreira rápido, pegou uns cinco, dez, vinte dos mais importantes e deixou passar. Maria Eduarda ostenta conquistas, que jura que nunca aconteceram, afinal ela gosta de acrediar que ainda é moça direita, que infelizmente caiu na boca do povo. Maria Eduarada age como se interpretasse um "Closer", só que com maquiagem e roupas melhores. Maria Eduarda se diz apaixonda, enebriada, entorpecida, sempre por alguém que não a olha, ou que é casado, ou mesmo por alguém que mora em Paris. Maria Eduarda joga contra, seu satélite safado busca as perspecitivas de outros, onde ela não pode ser passada pra trás, e a lança no humilhante vôo só de ida para o caminho dos solitários.
Maria Eduarda toma remédios, muitos remédios, uma coleção deles, pra acordar, pra dormir, pra emagrecer, pra parar de sofrer, pra ficar catatônica. Maria Eduarda te comprimenta reclamando, reclama que o drink está quente, que o vento está frio, que a balada está cheia, que a janela está aberta. Maria Eduarda pensa em suicídio, não que pense de verdade, mas acha que os outros acham que pensa. Maria Eduarda desenterra papos fúnebres, diz que vai morrer cedo em desastre de carro numa estrada de Mônaco, no melhor estilo Grace Kelly. Maria Eduarda desmascarada, agora tem um ar perdido, com um copo na mão no canto da noite, gira o olho nervoso em busca da próxima vítima. E você, olhando tudo de longe e já cansado desse filme repetido se pergunta: "Quem trouxe a Maria Eduarda?".

Friday, August 12, 2005

O MINISTÉRIO DA SAÚDE ADVERTE

Comece se imaginando sem amigos, com todo mundo a sua volta mas, sem amigos de verdade. Agora se imagine com oitenta anos e sem amigos, só com uns poucos netinhos e uns filhos que tem mais o que fazer. Horror né? Acho que cultivar amigos sempre deve ser uma prioridade na vida, ainda mais agora que um estudo feito por um centro de pesquisa autraliano, comprovou a tese de que não dá pra viver sem amigos.
Mais de 1500 pessoas, com mais de 70 anos, foram acompanhadas na cidade de Adelaide, Austrália. O Estudo Longitudinal de Envelhecimento na Austrália mostra que quem tem um círculo de bons amigos, mas amigo mesmo nao aquelas coisas só de fachada, tem 22% menos chance de morrer que os que não tem. Louco né?
Louco, mas faz muito sentido. Quem tem amigos ri mais, se diverte mais, compartilha mais, tem mais estabilidade emocional e por consequência é mais feliz. A felicidade está ligada ao bom funcionamento do sistema imunológico, endócrino e vascular. Além disso tudo, amigo se importa com você, pergunta se você está cansado, te faz ir ao médico, se preocupa com o que você come, se preocupa com você, porque ele, vai sentir falta no dia que você não estiver mais lá. Pronto, pode pensar que alquela sua vizinha velha e carola, que vive reclamando das suas festinhas, não perde por esperar. Se ela não tem amigos, provavelmente irá te encher por pouco tempo, à não ser que ela seja a "bacanona" da missa das 10 e o problema dela seja justamente você.
A primeira coisa que me tocou quando li sobre essa pesquisa, foi o fato da Autrália se preocupar e investir em um trabalho que a maior parte das pessoas consideraria banal. A Autrália aí já se mostra um puta amigo dos seus velhos. E a segunda coisa impressionante que esse estudo mostrou, foi que família não basta e muitas vezes não conta como amigo. Família é família, e amigo é amigo. Amigos e familiares são diferentes, e tem que ser, um te confronta e a outro te conforta em diferentes momentos, você ama os dois, você quer os dois, você tem que alimentar os dois e à partir de agora, está cientificamente provado, que você precisa dos dois pra viver.

Wednesday, August 10, 2005

O DIA QUE VOCÊ PRECISA

Vamos dar uma idéia do cenário geral. Primeiro você acorda atrasado, mas não um atrasado normal, um atrasado do tipo perdi-a-academia-e-se-demorar-mais-sou-mandado-embora. Aí você toma um banho urgente e se veste desesperado ao som da reforma interminável que o seu vizinho está fazendo. Seu cabelo é um problema à parte, depois do banho ele secou muito rápido e você ficou parecendo uma versão latina do Koisume, o primeiro ministro japonês. Sem mais delongas você pega qualquer coisa no guarda-roupa, se joga dentro e sai desembestado pro trabalho, como se um pitbull tivesse correndo atrás de você.
Ao chegar a sua chefe te olha, como se você já estivesse lá há horas e fala: "De urgente a gente tem...". Sua vontade é de gritar: "Como assim de URGENTE?!!! Eu acabei de chegar!!", mas você respira fundo, começa sua sina e deixa o mundo cair. Como que por obra de um destino muito canalha, seu escritório também está em reforma, o barulho te tira completamente a concentração, pó cai na sua cabeça, furadeiras e marteladas são a trilha sonora.
Na hora do almoço você resolve que já é muito tarde pra convidar alguém e vai sozinho mesmo. Come uma comida que não era bem isso e vai levando o dia nas costas. Ao cair da tarde o layout que você fez e achou que estava bom, já tinha sido refeito quatro vezes porque o briefing mudou e, na atual conjuntura ele parecia um Frankestain. O resto do dia corre como se você estivesse anestesiado. Quando você sai do trabalho, esgotado, lá pelas oito horas da noite, você decide que hoje é um dia que você precisa...
Precisa beber, precisa ver seus amigos, precisa dar risada, precisa se divertir, precisa ser compreendido, precisa falar merda, precisa falar qualquer coisa, precisa se sentir querido, precisa ouvir que os outros estão com saudades, precisa relaxar e precisa fundamentalmente de um abraço. Desculpem os que não querem se dar, os que não podem compreender, prometemos que não será todo dia, porque quem faz isso sempre é o chato, mas tem dias, alguns pouquissímos dias que a gente só precisa...

Monday, August 08, 2005

QUADRILHA

Jõao ama Maria, que ama Pedro, que ama Antônia, que ama Carlos, que ama Lúcia, que ama Paulo, que ama Márcia, que ama Alberto, que ama Marcos, que ama Larissa, que anda indecisa entre o Cláudio e a Regininha. A vida de todo mundo tem dessas passagens. O engraçado é que trocando os nomes essa poderia ser a história de muita gente que conhecemos, até mesmo a nossa, e o poema onde me inspirei pra escrever essa bobagem foi escrito há um puta tempo, quando o Carlos Drummond de Andrade estava em um momento ímpar de inspiração. O poema inteiro, tem um final diferente, mais romântico, mais poético, mas na nossa vida o fim é como o meu mesmo, tudo mal resolvido com um monte de gente envolvida e pouca solução.
Nunca fui muito fã de ler poemas, sempre achei a profundidade deles um pouco chata e confusa, mas acho que hoje, devido à profundidade que a minha própria vida tomou às vezes, mas muito às vezes mesmo me pego lendo poemas. Nada famoso, nem nada "nova geração progressista de vanguarda, etcétera", mas uma coisinha aqui outra acolá, eu leio sim.
Quadrilha eu conheci de um modo estranho, estava sentado em um ônibus (no tempo que eu ainda pegava ônibus) e uma menina, mais ou menos da minha idade estava elndo um livro de poemas... Como eu não tinha nada melhor pra olhar dentro do coletivo e muito menos fora, resolvi pegar carona na leitura da garota, afinal como era um pouco só de texto por página, sempre com começo meio e fim eu podedia ler, desencanar, voltar a ler. Até porque que lê poemas para depois pra refletir.
Foi então que no alto da página estava lá escrito: "Quadrilha". Eu pensei que devia ser algum tipo de bobajada, a lá "festa de São João" e li. Ao terminar não entendi e voltei ao começo, li de novo e de novo, ao olhar para a menina, ela estava aos prantos, chorava copiosamente e as lágrimas caiam gordas no livro. Parei na hora de ler o livro da garota! Menina louca! Lê uma coisa daquelas e chora!? Essa história passou e muito tempo depois eu vim reler "Quadrilha", não é que, ao entender toda a complexidade do poema, ao ver que a nossa vida com o passar dos anos fica cheia desse tipo de desencontros, tive que enxugar a lágrima que escorreu no meu rosto. Mas eu acho que essa lágrima não escorreu só por eu ter me ligado do que antes era complexo demais pra mim, mas sim por eu também ter compreendido os motivos daquela garota chorona do ônibus. Que fim será que se deu na quadrilha dela?
Com vocês, Carlos Drummond de Andrade: "João amava Teresa que amava Raimundo, Que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili, que não amava ninguém. João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento, Raimundo morreu de desastre, Maria ficou pra tia, Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes, que não tinha entrado na história."

Thursday, August 04, 2005

OS CONHECIMENTOS DAS PERGUNTAS

Ontem eu recebi um e-mail de uma amiga que com certeza me fez voltar no tempo. O e-mail continha um monte de perguntas simples respondidas por essa amiga, que eu deveria responder também e reenviar pra ela. Além disso eu também deveria enviar esse e-mail para os amigos que eu gostaria que respondessem essas perguntas, e foi o que eu fiz. A experiência foi fantástica, as respostas que eu obtive foram incríveis, e pude percebere que conheço pouco aqueles com quem eu convivo. Tudo me fez lembrar dos cadernos de perguntas que rolavam direto na classe durante a quinta série, se tornaram mais raros na sexta e cafonas na sétima, para minha tristeza.
Sempre achei que você só conhece realmente uma pessoa, quando sabe de que fruta que ela mais gosta, que sabor de picolé ela prefere, se quando toma sorvete de massa prefere copinho ou casquinha, qual sua cor predileta, quantos filhos gostaria de ter, qual o nome do seu primeiro cachorro, que dia da semana ela corta as unhas, entre outras idiotices. Esse tipo de pergunta só tem resposta se você conviveu muito com a pessoa e notou isso sozinho, ou se você já conversou tanto com ela, a ponto de os assuntos normais se esgotarem e vocês se verem obrigados a conversar sobre coisas menos usuais.
Para os adolescentes da minha geração, o pretexto para conhecer alguém mais a fundo eram os cadernos de perguntas. Neles você encontrava das perguntas mais comuns às mais descabidas, todas ali, esperando pela sua resposta, e você ainda podia colocar uma resposta igual a de alguém com o famoso "idem"(as respostas mais criativas, ou das pessoas mais populares sempre eram copiadas por vários "idem"). O melhor dessa história era quando você era amigo da dona do caderno e podia levar pra casa pra responder, aí além de colocar suas respostas você ainda podia ler uma por uma das respostar e achar com a suca cabeça de criança, que conhecia todo mundo que estava alí. Na boa, era quase um "Orkut Manual Portátil". Engraçado como achamos formas novas de fazer as mesmas coisas.
Lendo as respostas dessa minha amiga eu me perguntei de quantas pessoas hoje, eu sei qual é a música preferida? Quantos dos meus amigos eu sei que já passou por algum acidente? Ou mesmo qual é o livro que mais marcou as pessoas que eu gosto? Só sei que foi me dando uma vontade enorme de passar aquele e-mail para toda a minha lista de e-mail, pra todas as pessoas do trabalho, pra toda a família mas daí eu me contive. Pensando bem, mas bem mesmo sobre o assunto, não é todo mundo que eu quero que saiba qual é minha comida preferida, tem gente que eu prefiro que adivinhe.

Wednesday, August 03, 2005

A TRILHA DE UMA QUEDA

Todas as pessoas que se aproximam dos trinta com certeza já sofreram por alguém, ou já foram chutadas, ou já foram traídas ou já sofreram por sofrer, simplesmente. Sofrer por alguém é algo nato na minha opinião, desde os primórdios as pessoas já sofrem umas pelas outras. Concordo que antigamente era mais poético e enchia os trovadores de inspiração, mas acho que hoje passa um pouco batido, talvez porque a oferta seja muita, talvez porque a nossa vida atribulada não nos deixe parar pra pensar ou mesmo porque talvez tenhamos descoberto que que não é legal sofrer por alguém, talvez hoje em dia gostemos um pouco mais de nós mesmos. Mas o fato é que já aconteceu com todo mundo, e mesmo com tanta modernidade e avanço ainda não inventaram nada que pudesse curar isso. É incrível a quantidade de gente linda, interessante, inteligente, que não tem bafo nem xulé, que sofre por cada uma que pelo-amor-de-Deus!
A melhor coisa a se fazer, depois que acontece uma dessas com a gente, é parar, lamber as feridas e se preparar para a grande volta por cima. Ela pode demorar pra chegar, mas como o mundo é redondo (e isso ele é mesmo), um dia ela vem. Pode vir na forma de um grande novo amor, ou então numa carreira bem sucedida, ou mesmo na forma de uma pequena, doce e inigualável "caída na real"...
Imaginem então que alguém tenha te feito sofrer, o suficiente pra você nunca mais olhar na cara dessa pessoa. Acrescente a essa lembrança uma festa badalada algum tempo depois, quando vocês finalmente conseguem conviver socialmente. Na hora que vocês se vêem sua cara é de surpresa (pode imaginar aquela sirene do "Kill Bill" tocando), depois vocês passam a conversar como civilizados que são, mas como ambos são loucos vem surgindo aquele sentimento de carinho (que você queria ter matado no primeiro momento) e em seguida aquele papinho-pré-xaveco. Você sente que alguma coisa está errada, que aquilo não vai dar certo, procura alguém pra te tirar dali, passa os olhos na festa toda em busca de socorro, mas na hora quem não está bêbado, já foi (nessa hora pode estar tocando "Light my Fire" do The Doors).
Depois de muitos e muitos goles, depois da conversa ter esquentado, esfriado e voltado a esquentar um milhão de vezes, você se achando um idiota, mas mesmo assim curtindo o que está acontecendo, oferece uma carona (música da abertura do "Sex and the City").
Ao chegarem na porta do apartamento, você aceita um convite pra subir e conhecer as mudanças da casa nova. Ao chegar lá em cima, a geladeira está envelopada, tem quadro novo na sala, você vira pra comentar alguma coisa e o beijo rola... (a trilha agora é de "Satisfaction" com "A Rainha da Noite").
Depois de um tempo de beijos, bocas inchadas, tentativas de tornar aquele encontro muito mais que um acaso, depois de muita coisa ser dita nas entrelinhas, depois de perder a noção da hora, passa pela sua cabeça o que você estaria fazendo ali. Quem te deu o direito de esquecer? Você para, olha fixamente para ela que tanto te fez sofrer, lembra de tudo com uma aparência sem reações, respira fundo e fala: "Vou embora".
"Como assim vai embora? O que aconteceu?" diz ela não entendendo o motivo disso tudo. Você não responde nada, afinal de contas, você não precisa responder em algum lugar dentro da cabeça ela deve lembrar, simplesmente você sai, batendo a porta atrás de você com a certeza de que nesse erro você não cai mais. Você sorri, caiu na real sem se machucar mais. Enquanto desce a escada de incêndio, é possível escutar em sua cabeça a última música dessa trilha sonora alucinante, The Blower's Daughter, a música do Closer: And so it is, Just like you said it would be, Life goes easy on me, Most of the time, And so it is, The shorter story, No love, No glory, No hero in her sky...

Monday, August 01, 2005

ADMIRÁVEL MUNDO NOVO

Era uma vez um planeta bem tamanho médio em relação aos seus irmãos, onde só existiam vulcões, mares revoltos, muita lava quente e muito espaço. Um belo dia, sabe-se lá porque, apacereceram nesse planeta, vindas do nada (nunca acreditei muito nessa parte), umas pequenas celulazinhas que conseguiam se alimentar e se reproduzir naquele ambiente inóspito. Como nada pode ser perfeito essas células começaram a ter filhos defeituosos e diferentes de seus pais. Algum tempo depois, e bota tempo nisso, esses filhos "errados" tinham formado os incetos, os peixes, as samambáias e os macacos. Por outra assombrosa obra do destino (essa parte é pior ainda de engolir) os macacos começaram a sofrer o mesmo processo daquelas pequenas celulazinhas e ter filhos "diferentões". Depois de outro bloco enorme de tempo, aparecemos nós.
Já passaram por esse mundo, que ficou um pouco melhor sem o monte vulcões e mares revoltos, cerca de 90 bilhões de pessoas, basicamente com os mesmos problemas, angústias e necessidades que a gente. Existem hoje para cada um de nós, seres humanos vivos, cerca de 15 mortos que já viveram por aqui, proporção maior que a de ratos existentes, que é de 10 para cada homem e bem menor que a de insetos que é de 200 milhões para cada humano sendo que 1 milhão é só de formigas. Resumindo, o mundo nunca esteve tão habitado como hoje em dia e não é a toa que a galera anda se preocupando tanto com o 1% de água potável que ainda temos pra consumir.
Foi analisando tudo isso, o fato do mundo onde eu vivo já ter hospedado tanta gente, de estar tão visto, tão usadinho, tão batido e também o fato de eu estar vivendo em uma época onde com certeza cada canto deste planeta já foi explorado, revistado ou desenhado pelo Google que eu me perguntava como a gente consegue viver os mesmos problemas que provavelmente nossos avós viveram? Como o ser humano consegue ser tão repetitivo? Como consegue ser tão cíclico sem se ligar no que está acontecendo?
Não sei se ando revoltado com a mesmice dos problemas e situações que eu e as pessoas que eu convivo tem, mas é que sinceramente, já deveriam ter inventado um modo de certos problemas não existirem mais. Coisas como falta de grana, carência, corrupção em Brasília, alta desigualdade social, terrorismo, falta de condições básicas e dor de garganta já deveriam ter sido extintas pelos dinossauros, mas não, estamos nós aqui padecendo com as mesmas angústias. Não é que eu queira problemas novos, esses pelo menos eu já sei como lidar, mas será que algum dia essas coisas simples vão ter soluções simples também? Acho que a humanidade, nesses seus séculos de existência já passou por coisa bem pior e ultimamente vem se repetindo na categoria provações, ou por não ter achado nada melhor ou por achar que se a gente não resolveu nem o básico, como pode estar querendo passar para o nível 2?
Se com a Terra desse tamanho a gente já pena pra conseguir se acertar, e nesses anos todos nunca conseguimos, imagine então se ocupassemos a área de Júpter? Talvez esse planeta já seja grande demais pra gente tomar conta, afinal nós e as samanbáias descendemos daquelas mesmas celulazinhas e esperamos conseguir nos mortrar grandes antes que algo realmente grave aconteça.