Monday, November 12, 2007

ENCONTRO ÀS CLARAS

Domingo a noite. Lá pelas 10h30 da noite. Um casal de amigos ultra-apaixonado, com um papo engraçado. Uma pizzaria. Uma Coca Zero bem geladinha. E na sua frente, uma visão que você preferia não ter tido nem quando chegar ao inferno.
Você se transfigura, seus amigos notam, você sua frio, quer ir embora, mas é inevitável que algum deles olhe pra trás e também veja sua ex-namorada se pegando com um cara na mesa a sua frente. Tenha dó né? Com tanta pizzaria em São Paulo!
O casal amigo tenta desviar o assunto, falar de outras coisas mas você não vê mais nada além daquilo, nem mesmo o garçom com a sua pizza queimando a mão dele.
Depois de se distrairem com suas línguas e mãos em plena claridade, eles pagam a conta e ela finalmente te vê. Vem caminhando em sua direção seguida peo cara e diz:
– Oi!!! Absurdo!! Sumido! – ela está linda, muito mais que há um ano e meio atrás. Vocês se abraçam. Sua pele está um pouco verde, mas algumas pessoas preferem acreditar que é reflexo da escarola da pizza – Meu onde é que você andava, garoto? Faz séculos que eu não te vejo! Quando foi a última vez? A gente se encontrou no shopping né?
– Foi, isso mesmo! Tudo bem? E aí? Como vai a Marrie? – você retribui o abraço rezando pro cara ter explodido.
– Ahhh ela está bem... Fofa né? Isso é jeito de falar da sócia? A gente mudou de escritório agora, contratamos mais umas 3 meninas pra trabalhar com a gente. Tá indo super bem! E você? Como vai a sua empresa? E a... Roberta? – o cara chega e dá a mão pra ela no melhor estilo, xixi-pra-marcar-território. Ele também é lindo e você dá uma ligeira medida pra ver se a bebedeira do fim de semana aumentou seu peso.
– Tá bem... Tudo bem graças a Deus! Mudei de casa, tô morando aqui perto agora.
– Meu que legal! Perto do escritório também!! Sorte!
– É... Qualidade de vida! Muito bom! – o silêncio fica grande demais. Vem a hora que você temia...
– Ahhh esse é o Sergio, meu namorado – você aperta a mão do sujeito, e ele devolve o apertão bem apertado. Dessa vez é como se ele marcasse território no seu pé.
– Oi, tudo bem? – você diz.
– Esse é que é o Zagaia. – ela completa.
– Ahhhh sei... Tudo bom cara?
"Esse é que é o Zagaia"? Como assim "esse é que é"? Como assim "ahhh sei"? Dá vontade de gritar: "o que vocês andaram comentando de mim?". Mas você não grita. Nem bate nele, nem nela, nem joga Coca Zero na cara deles, nem muito menos taca fogo na pizzaria. Você simplesmente sorri. Sorri amarelo. E volta a sentar com seus amigos. O que dizer em uma hora dessas? Melhor sorrir.

Wednesday, October 31, 2007

IGUARIA SEM IGUAL

E então chega a hora do almoço no sábado eu estou sem nada para fazer. Um amigo me liga e diz que está indo com umas amigas cariocas à Liberdade, passear e almoçar por lá. No geral o programa já cheira a roubada, mas eu acabei aceitando, nem imaginando que aquele almoço iria mudar minha vida para sempre.
Depois de almoçar num daqueles restaurantes japoneses sujinhos, em meio a passeios por lojas que não vendiam nada que eu estivesse com vontade comprar e mercadinhos que não oferecessem nenhum alimento facilmente identificado, uma das amigas do seu amigo começa desesperadamente a perguntar em alguns lugares por um tal de: sorvete de melão.
Era o que me faltava né? Ter que rodar no meio daquele monte de gente, procurando um sorvete de melão! Com o Sol a pino, a garganta já seca e os sashimis recém comidos, boiando no meio do misoshiro que eu arrematei no final do almoço. A essa altura eu já estava completamente arrependido de ter aceito o convite e pensava seriamente em me jogar do viaduto ou em rolar pela calçada dando gargalhadas histéricas. Desisti de rolar pela calçada, porque os ratos somados ao cheiro de peixe e lixo eram capazes de me transformar em alguma espécie mutante de besta mal-humorada. Foi aí que a amiga do meu amigo, chegou com notícias:
– Olha pessoal! Osh carash (ela era carioca!), alí daquela lanchonete disseram que o carregamento deles já vai chegar, que é só a gente esperar um pouquinho.
Ficamos parados então na frente do botequinho. As cariocas animadas, o meu amigo fazendo o meio de campo e eu com um bode preto amarrado na perna, louco de vontade de deitar e dormir, até que, eu vejo de longe um "chinezinho" carregando mais ou menos o dobro da altura dele em caixas. Ele entra no boteco, nós entramos também e imediatamente atrás de nós se formou uma imensa fila de gente desesperada perguntando: "Vocês estão na fila? É pro sorvete?".
Preciso falar que eu fiquei abobado? Um monte de viciados em sorvete de melão, que deviam estar rodando a Liberdade inteira, começaram a tirar dinheiro sabe Deus de onde e gritar na fila que já não cabia no lugar! Minha primeira reação obviamente, foi tirar 5 reais da carteira e provar o motivo que deixava aquelas pessoas tão loucas. Claro que tive que fazer uso de cotoveladas, tentar impor respeito com meu tamanho para finalmente colocar em minhas mãos, o Melona.
Sim, esse era o nome do sorvete. Melona. A embalagem era bonita, transmitia confiança, a fabricação é coreana e o formato era mais ou menos parecido com aquele sorvetão de Itú, só que quadrado dos lados e ele tinha mais ou menos a cor de um creme de abacate fresquinho.
Quando eu coloquei o Melona na boca, o mundo parou de existir ao meu lado.


Dei um espaço a mais, porque realmente uma lacuna no tempo se abriu enquanto aquela massa gelada se desmanchava na minha boca. O sabor era... Como eu posso descrever...? Era como se Deus, depois de ter criado flores, pássaros, rios, humanidade e tudo mais, tivesse criado algo realmente perfeito, uma fruta divina, um néctar da existência e depois disso fizesse um sorvete com essa fruta. Era indescritível. Era o mais puro gosto do melão que alguém já podia ter provado. Aquele sabor justificava tudo. Minha única idéia quando aquele sorvete acabou, era que eu só seria feliz se um dia eu nadasse em uma piscina de Melona.
Tentamos comprar mais, mas já estava acabando e a fila estava cada vez pior. Então decidimos voltar para casa e no caminho acho que todos sentimos um mesmo vazio, precisarímos ter o Melona ao nosso lado para sempre.
E pelo visto não fomos só nós que nos sentimos assim... Isso aconteceu mais ou menos há uns dois meses e hoje o Melona já ficou famoso, conhecido entre os absurdinhos e pode ser comprado até no Conjunto Nacional. Se eu soubesse que seria assim hoje em dia, com certeza não teria perdido tempo com meus amigos, bolando o sequestro do chinezinho que carrega o Melona.

Tuesday, October 23, 2007

TETO TEM LIMITE

Todo mundo que tem uma vida sexual ativa e movimentada, ou simplesmente só ativa, sabe o quanto é bom tudo que envolve uma boa noite de intensa atividade. E quando essa noite rola, o bom mesmo é não ligar pra ninguém, fazer o que se tiver vontade, sem regras, sem padrões e sem vergonha, sempre com muita responsabilidade. Se alguém escutar alguma coisa dane-se, se a janela estiver um pouquinho aberta também dane-se, se alguém começar a se divertir a suas custas, ahhhh... pense que você está se divertindo muito mais, certo?
Certíssimo, quando se trata de uma noite de sexo selvagem aqui e outra alí, mas não quando o casal resolve por em prática as mil e uma noites do Kama Sutra. Digo isso, porque não aguento mais ser acordado quatro a cinco vezes por semana com o lustre do meu quarto balançando, gemidos altos e os toc-toc's repetidos vindos do teto. E quando tudo isso parece terminar, ainda vem uns gritos mais altos ainda de "ahhhhhhhhhhhhhhhgh meu Deus".
Será que eles acham que ninguém escuta? A sonoplastia é perfeita! O designer de som devia ser premiado com o próximo Oscar do cinema pornô. Eles deviam gravar se tem tanto orgulho disso! Gravar e colocar no youtube, como a Cicarelli fez.
O pior é que fico um pouco mal humorado quando sou acordado, imaginem então quando rola uma invejinha. Tenho vontade de passar a mão no interfone e ligar lá, de dar vassouradas no teto, mas tenho medo de parecer a bruxa, sendo que já moro no 71. Sim, porque quando se pensa em tomar uma atitude pra reprimir, é preciso arcar com as consequências e é isso que eu temo, sendo o morador novo do prédio. Morro de medo de ficar visto como aquele que está se corroendo de inveja porque não tem isso em casa... Aí pra saír de uma desse estígma, só se gravando no ato e jogando no cirquito interno de tv do condomínio. E eu não pretendo fazer isso tão cedo.
Tenho pensado ultimamente em concorrer com eles, mas para isso minha agenda de telefones vai precisar pelo menos dobrar de tamanho, e eu ainda vou ter que esquecer o passado e superar tudo que eu já passei na mão de certas pessoas, sim porque vai ser necessário repetir figurinhas. Foi assim que, de uma semana pra cá, decidi que vou apenas fingir que concorro com eles, vou baixar uns pornozinhos pesados, comprar uns apetrechos de percussão e umas caixas de som super-ultra-blaster potentes e mandar ver no gemido abafado, e nas puladas na cama. Me recuso a perder essa sendo taxado de careta invejoso e reprimido. Na pior das hipóteses, quando eu encontrar no elevador com o pessoal do 81, eles vão pensar que ainda existe gente à altura para uma competição.

Friday, October 19, 2007

AUMENTAR PRA NÃO TERMINAR

É assim ó: eu aumento um ponto! Sabe aquele ditado que diz que quem conta um conto aumenta um ponto? Pois é, sou eu que aumento! Sempre aumentei! E se for pensar bem um ponto só não, aumento vários, páginas de pontos, uma infinidade de laudas. Na verdade acho que tenho uma visão muito própria sobre a minha própria vida.
Isso não quer dizer que eu minta. Não suporto mentiras, nem tenho paciência com gente mentirosa. Mas vamos dizer que, quando eu conto alguma coisa eu dou uma romanceada em tudo, em tudo mesmo. Até uma simples ida à padaria no domingo de manhã tem um clima, uma roupa, um detalhe sórdido e um monte de adjetvos. Tenho uma amiga que diz que eu sou hiperbólico, mas é óbvio que ela é a pessoa mais louca do mundo inteiro.
Acho que essa arte de acrescentar às pequenas narrativas do dia-a-dia é a grande responsável de, na grande maioria das vezes, eu não conseguir terminar nada do que eu começo a contar. Sempre coloco tantos detalhes, situo tanto o ouvinte, coloco tantos hiperlinks, que como um assunto puxa o outro a história principal sempre fica perdida e eu nunca lembro como cheguei até ali. E essa semana eu percebi que é de família.
Ontem, jantando na casa da minha mãe, com minha irmã, meu cunhado, meu pai e minha própria mãe, eu ouvi mais ou menos umas 20 histórias e hoje ainda não consegui saber o final de nenhuma. Gente louca! Era um tal de "e por falar nisso" pra cá, um tal de "ahh lembrei" pra lá, que ninguém conseguia chegar ao final de nada. Comecei a me lembrar de todo mundo que reclama que eu não termino assunto nenhum, e pensei que vindo daquele meio é realmente impossível.
No fim do jantar eu me dei conta disso, e falei que aquilo estava me angustiando, que eu precisava saber o final de alguma história pelo menos. Foi nessa que meu cunhado deu um sorriso e perguntou: "Ué! Desaprendeu a conversar com a sua família? Vocês sempre conversaram assim".
O silêncio durou um tempo, todos olhando pra minha cara. Pouco depois e mais que depressa voltaram a falar correndo sem terminar assunto nenhum novamente.
É, acho que quando eu morava com eles não percebia toda aquela quantidade de informação ao mesmo tempo, ou se percebia talvez soubese lidar com o fato. Era muita gente, se tinha muito a dizer, muito a compartinhar em tão poucas 24 horas. Saí da casa da minha mãe com dois sentimentos muito claros: o primeiro que só agora eu consigo olhar de fora para minha família e amar aquela confusão toda; e o segundo é que mesmo olhando de fora, tem certas certas coisas que sempre me farão ser um deles.

Tuesday, October 09, 2007

A ARTE DE SE TORNAR VINTAGE

Tem coisas na vida da gente, que nos acostumamos e aprendemos a amar como se elas tivessem feito parte da nossa existência desde que pusemos o pé por aqui. É comum inclusive mudar lembraças e desconfigurar o cérebro todo só achando que quando seu avô bateu o carro em 1986, ele ligou no celular da sua mãe pra avisar. Sim eu não imagino como era a minha vida sem o celular, sem o Xbox, sem o laptop, sem DVD, sem baixar música na internet e principalmente sem iPod.
A gente sofria demais! Alguém lembra o que era andar com ficha telefônica e pegar fila no orelhão? E jogar Enduro no Atari com aquele controle duro que dava calo na dedo? E ainda existia coisa pior! Como por exemplo, ter que ir à casa daquela sua prima chata só bater um trabalho no computador de tela verde, ou mesmo rebubinar a fita antes de entregar, ou comprar um CD por causa de uma música que você só vai escutar uma vez na vida. Olha, ainda bem que a humanidade evoluiu viu? Se não, eu não ia aguentar!
Mas pra mim, ainda está para nascer quem vai inventar uma coisa melhor que o iPod. O iPod, como diria meu avô é uma benção. O iPod é a máxima do poder de síntese, com o máximo de capacidade. É a liberdade de poder andar por aí com todos os seus cd's, carregando algo bem menor que um só deles. Além disso tudo, é lindo, fácil de usar, tem tudo que é meu lá, um verdadeiro absurdo. O meu iPod é máximo, ou melhor, era...
Sim era, porque duas semanas atrás ele se suicidou. Se suicidou mesmo, sem arrependimento, sem misericórdia e sem pensar nem um pouquinho na falta que eu ia sentir dele. Meu iPod se jogou no fosso do elevador. Se jogou de maneira clara, direta e certinha para caber naquele buraquinho tão desgraçado, se jogou para nunca mais voltar num vôo de sete andares, sem volta, em direção ao térreo. Sim, eu me desesperei, chorei, chamei o porteiro, abri o elevador e resgatei seu corpo intácto, mas já sem vida. No iPod Hospital eles não me deram nenhuma esperança e eu fiquei aqui, sem o meu amigo para dividir as canções. Praticamente um Xitãozinho, sem o Xororó.
Ontem cançado de tanto sofrer e parecer um louco pela rua cantando em direção ao trabalho, tentando lembrar de como era a minha vida sem meu querido amigo, eu gravei um cd com o que eu queria ouvir e coloquei no diskman velho que eu já tinha aposentado há muito tempo. E foi aí nesse momento que eu me senti vintage, resgatando uma moda antiga e fingindo que eu não estou nem aí comm isso. Se alguém me ver andando com pochete, sapato uísque com cinto combinando ou ombreira no casaco, saiba que me dando um iPod novo, tudo vai passar...

Thursday, June 21, 2007

HOME ALONE

E então um dia você o acha! E ele está lá, lindo, branco, conservado, todo estiloso e com um piso de madeira, daquele de taquinho dos anos 60 de fazer inveja a muita mansão da vizinhança. Você de primeira não acredita, pensa que é mentira que finalmente alguma coisa que você gosta, cabe no seu orçamento. Mas é verdade e como num passe de mágica, tudo que conspirava contra até então, vai por um caminho sem buracos que culmina na entrega das chaves do seu apartamento perfeito.
A cerimônia de entrega das chaves da sua nova casa começa com você sozinho comendo uns polvilhos no chão sujo da sala, e termina com alguns amigos e familiares tomando coca light no mesmo chão sujo. A primeira faxina é nojenta, o primeiro banho é medonho, a primeira noite estranha, mas é tudo lindo, tudo poético, tudo solucionável.
Até que chega a hora de mudar de verdade e o seu primeiro final de semana se resume à uma arrumação que parece nunca mais ter fim. E não tem mesmo. Nessa hora, tudo que era lindo, poético e solucionável, vira pó. Literalmente.
Além disso, a quantidade de transeuntes dentro do seu lar é algo inimaginável. Tem o cara do fogão, os entregadores da geladeira, o pessoal que veio montar a cama, o homem do vidro, o maluco das chaves, o porteiro te explicando a política do prédio, a síndica, os vizinhos da frente com um bolo, a mãe empolgada, os amigos que passam pra "conhecer", o sobrinho, os irmãos, o cunhado e o pai instalando algumas coisas, entre outras milhares de pessoas.
É tanta gente, tanto barulho, tanta confusão e sujeira, que quando todo mundo vai embora, e você fica sozinho em casa o melhor que se tem a fazer é acender um cigarro, pegar uma latinha de qualquer coisa bem gelada, um resto de pão com alguma gororoba e sentar na frente da máquina de lavar pra assistir um ciclo completo. E essa com certeza será uma das melhores lembranças do dia que você foi morar sozinho. Você tomando a sua cerveja, fumando seu cigarro, comendo seu pão com gororoba e assistindo a sua máquina de lavar trabalhar na sua casa.

Tuesday, June 12, 2007

A CASA DOS GATOS

Faz um tempo já. Na verdade parece que faz mais tempo ainda. Sabe aquilo que faz tempo, mas que por ser outra fase, parece que faz mais tempo do que realmente faz? Pois é... Essa história é dessas histórias. Era por coincidência dia dos namorados também, como hoje. E quatro amigos revoltados com a data foram comemorar o fato de serem solteiros, de passarem o mundo na cara e de se divertirem com desaventuras.
Nessa noite, na noite de rir de sí próprio, foi que esses amigos criaram um lugar muito especial. Nessas de "pra onde a gente vai?", "o que vamos fazer agora que estamos bêbados?", uma das meninas sugeriu a Casa dos Gatos. No cenário meio non sense que aquela noite estava virando, não foi estranho o fato daquela amiga começar a se abrir.
Ela disse que apesar da companhia se sentia só, que apesar das risadas se sentia triste e que apesar da bebida sentia medo. Um medo diferente, um medo de futuro que se aproximava do presente, um medo que a levasse à um fim na Casa dos Gatos.
A Casa dos Gatos dos pesadelos dessa amiga era um lugar escuro, onde provavelmente povoada por clichês da infância, a garota colocou a velha solteirona, de 73 anos, que cansada de ser sozinha, criava gatos pra amenizar a solidão. Não 1 nem 2 gatos não, coisa de 23, 47 bichanos loucos de fome e miando sem parar. E a velha conhecia cada um, pelo nome, cada mania, cada cicatriz e cada desafeto dos bichinhos.
Nem preciso dizer a cara dos outros 3 na mesa, passada a descrição do pesadelo de velhice infame que assolava a quarta integrante do grupo. Se fez silêncio por um tempo até que um dos 3 soltou um: "Relaxa, a gente vai te fazer companhia lá". E então, à partir desse momento, a Casa dos Gatos se tornou menos pesada, menos fúnebre e ganhou uma TV de plasma, uma mesa de carteado, uma infinidade de cd's, muitos passaportes carimbados e muita, mas muita mesmo bebida em estoque.
Desse dia em diante, todos os happys, todos os dias, esses amigos celebravam a idéia de que a Casa dos Gatos era um porto seguro, um lugar pra onde correr quando tudo desse errado, um lugar não tão ruim assim porque a gente tinha a gente.
Mas a vida separou a gente, a amiga assombrada hoje está cada dia mais longe da Casa dos Gatos, e numa saída recente com as duas com as quais ainda tenho contato dia desses uma delas soltou: "a gente se bastava né?". E era isso mesmo, a Casa dos Gatos perdeu seu poder de assustar porque a gente se bastava.
Óbvio que ainda hoje, às vezes eu ainda tenho medo da Casa dos Gatos, como nesse dia dos namorados sozinho, até porque na minha casa não teriam gatos, que são animais aos quais sou alérgico. Mas então, de lá de dentro vem um pensamento: "Será que eu me basto?", e aí vem a resposta: "Acho que sim..." e tudo fica mais tranquilo.