Friday, June 23, 2006

O CRAVO E A ROSA

A Marcinha é assim mesmo, se apaixona por histórias que ela mesma inventa. Gosta da cena, da imaginação, do que cerca um caso de amor. Muitas vezes a Marcinha gosta até de pegar trânsito, só pra no caminho ir imaginando uma paquera ou talvez uma vida inteira com o cara do carro do lado.
Mês passado a Marcinha mudou de estacionamento, um começou a cobrar caro demais e do lado da delegacia, tinha outro que era bem mais barato. Todas as manhãs, ou a maioria delas, quando deixava o carro pra ir ao trabalho a Marcinha via um homem parado na frente da delegacia ou falando no celular, ou conversando com alguém, ou fumando um cigarro. O cara não um garoto, nem um franguinho, era um homem mesmo, com letra maiúcula, desses que, segundo a Marcinha, tem jeito de ter "pegada". Não demorou muito pra Marcinha começar a chamar o moço de "Delegado" e ficar ansiosa todas as manhãs pra ver se o danado do cara olhava pra ela.
Gostava de imaginar que um dia o "Delegado" iria chegar bem malandro, dizer alguma graça e convida-la pra sair. Que um dia ela iria ver que aquele jeito de "broncão" do "Delegado" era só fachada, que na verdade ele era um homem sensível, que gostava de música clássica, apreciava bons vinhos e cuidava do afilhado no fim-de-semana prolongado.
Pensar no delegado se tornou o passatempo predileto da Marcinha. Ela imaginava histórias com ele de manhã, no cinema, quando alguém no trabalho começava a discutir e até mesmo vendo Belíssima. A Marcinha tentou tirar fotos do Delgado com o celular, simulou tomar um tombo na frente da delegacia, entrou no D.P. pra fazer um B.O. falso e ver se cruzava com o cara e nada. Nada mudava na história da Marcinha.
Semana passada, por causa de um trabalho da agência, a Marcinha teve que acordar super cedo, ir até a Dr. Arnaldo e comprar uma cacetada de cravos. Como todas as manhãs ela estacionou o carro, pegou tudo que era seu e foi em direção a agência, só que desta vez ela levava com ela as 7 dúzias de cravos coloridos necessários para o job. Passou em frente a delegacia e nada do "Delegado", não podia acreditar numa coisa dessas. Justo hoje ele não estava! Justo hoje que ela tinha tudo pra chamar a atenção... Virou a cabeça, deu uma última olhada por cima do ombro e... PUMBA!!! Foi difícil não sentir o tranco daquele "homão" batendo de frente com ela.
Os cravos cairam todos pelo chão, e a Marcinha não podia acreditar no que via. O delegado bem ali na sua frente, olhando pra ela e pro monte de cravos. Era a chance dele! A chance dela! Nada podia ser mais perfeito que isso! Ela, o "delegado" e cravos pelo chão, ele agora podia dizer qualquer coisa... qualquer coisa já teria tornado sua fixação realidade. Foi então que ele abriu a boca e disse: "Soooooooorrryyyyyy dear!!!" na mais perfeita entonação de Clodovil que que a Marcinha pode entender. E ainda saiu saltitando sem nem mesmo ajudar a menina a recolher os destroços.
Até hoje, passar na delegacia ainda é motivo de vergonha interna pra Marcinha. Mas como é que ela poderia imaginar, sendo que a imaginação era tão mais divertida?

Tuesday, June 06, 2006

O CAMINHÃO DA GRANEIRO CHEGOU

Pronto, sei que agora eu demonstrei a idade, mas a vida é assim mesmo uma hora tudo vira verdade. Essa frase era de um comercial velho, mas bem velho mesmo, onde tinham umas crianças brincando numa laje e de repente chegava o caminhão da Graneiro, uma empresa de mudanças muito famosa na época, e o menino gritava: "Mãe, o caminhão da Graneiro chegou!".
Lembro que isso me dava uma angústia, pois nunca fui muito fã de mudanças e sempre achava esquisito o aquelas pessoas começarem a empacotar as coisas felizes da vida. Foi essa mesma angústia que senti quando notifiquei a equipe que eu trabalho que eu os estava deixando, depois de quase 8 anos juntos.
Pensei na hora no pessoal da Graneiro chegando pra carregar as minhas coisas, vindo embrulhar meus pertences, meu Santo António, minha tabela Pantone, as fotos do meu afilhado, e eu senti a mesma angústia. Aquela bem chata, lá no fundo do peito.
É estranho mudar, é estranho ver que tudo vai continuar depois que você for, que as pessoas vão continuar seguindo seus rumos. Tudo bem que umas vão sentir mais do que outras, mas a verdade é que nada vai mudar muito pros outros. Sem querer ser tétrico, é mais ou menos como morrer.
Só sei que hoje, fazendo as vezes de mocinho da Graneiro e levando embora as coisas aos poucos, pra não sentir muito a porrada, eu percebi que nesses 8 anos, cumpri a minha parte. Fiz grandes trabalhos, fiz grandes amigos, ganhei jogo de cintura, perdi papas na língua e principalmente acreditei no que eu fiz durante todo esse tempo.
Enfim, mudar é estranho mas quando é num caso como o meu, um caso de livre e espontânea vontade, gera também um frio na barriga e uma vontade de ver no que vai dar. O que vai ficar mesmo é a saudade de conviver com as pessoas que eu aprendi a viver todo esse tempo e que querendo ou não, se tornaram minha família, mas essa saudade eu pretendo curar num chope.